Hoje este blogue faz 11 anos, yééé, parabéns Sopa! ;)
Amanhã faço eu 53 e, tal como o pato da canção, também venho cantando
alegremente, quá,quá... ;)
Se olhasse
friamente para a minha vida actual, encontraria mais razões para chorar do que
para cantar... mas estou apaixonada, e a paixão é cega. Ultrapassado o meio
século descobri a minha verdadeira vocação e ando completamente de cabeça
perdida.
Acabei o liceu
sem a mais pequena ideia do que queria ser, agora que já era grande. Fui para
fotografia, mas rapidamente me dei conta da minha mediocridade nessa area.
Segui então para design de moda, esquecendo-me de um pequeno detalhe; não sei
desenhar. Assim, ao fim de cerca de sete anos de estudos, tinha regressado ao
ponto de partida; que raio vou eu fazer com a minha vida?!
A partir daí improvisei, atirando-me literalmente a tudo – não vos passa
pela cabeça a secaaa de trabalhos que tive de fazer ao longo da vida - o que me
permitisse ir mantendo a cabeça fora da água. Com autodidatismo, movi-me por várias
áreas, chegando a dominar várias delas com bastante competência. Colaborei também
em vários projectos com outras pessoas, abracei alguns sozinha, tive ideias,
tive sonhos, tive esperança, tentei, dei o litro, falhei.
A realidade é que, mal ou bem (geralmente
mal…lol), fui conseguindo ganhar o suficiente para viver. Mas uma coisa nunca tinha retirado do meu
trabalho até hoje; genuíno prazer!
A idade é uma coisa curiosa, vamos perdendo
em termos físicos, mas ganhando em termos intelectuais e emocionais. Não gostaria
de voltar à adolescência nem que me pagassem. A não ser a saber o que sei hoje, claro, isso é que era… Dito
isto, ali à roda do meio século - provavelmente não exactamente no dia dos meus
anos, estilo bactéria do iogurte que, como toda a gente sabe, ataca à meia
noite do dia do fim do prazo de validade - mas mais ano, menos ano, entrei numa
crisezinha existencial. Às tantas dei por mim a perguntar-me se realmente iria
passar o resto da vida a trabalhar para aquecer (quase em sentido próprio… lol).
A
decisão de escrever o livro foi já um
sintoma disto. Nunca tive, no entanto, grandes ilusões – e agora que conheço um
bocadinho melhor o meio livreiro não tenho nenhumas mesmo – de vir a fazer
algum dinheiro que se visse com ele. Só alguns eleitos se safam financeiramente
partilhando as suas palavras. Dediquei-me assim a ele mais para fazer o
gostinho ao dente do que na esperança de algum dia vir a conseguir viver da
escrita.
Para
além desta, a que desde de miúda me entrego, o meu outro grande prazer,
descoberto já bastante mais tarde, são as manualidades. Não aprendi a fazer
tricot e crochet em menina, ensinada pela mãe a avó ou a tia, fui aprendendo sozinha,
na net, já muito depois de atingida a idade adulta.
Costuma dizer-se que “a necessidade faz o engenho” e é bem verdade. Debatendo-me
há anos com enormes dificuldades financeiras, em que comprar, seja o que for,
não é propriamente opção, não me deixei atrapalhar e, o que não consigo
comprar, faço-o eu. E foi assim que tudo começou, obrigada crise, que fizeste
desabrochar a engenhocas que há em mim. Fiz, luvas, vestidos, camisolas, casacos, meias, remendos
para cobrir os buracos nos ténis, malas, candeeiros, vide poches, tampas de açucareiro, armários, hortas, e sei lá mais
o quê…
Nesta luta para pôr comida à mesa, lembrei-me então de fazer coisas para vender. Um dia chegou uma amiga cá a casa,
entusiasmadíssima, a dizer que tinha visto um colete em crochet giríssimo, na
Zara. Mostrou-me a foto e perguntou se não queria fazer-lhe um igual, que preferia
dar-me o dinheiro a mim do que a eles. O dito cujo estava à venda por 20
ou 30 euros, eu demoraria, no mínimo,
uma semana a fazê-lo. Dei-me assim conta de que por esse trilho não iria a lado
nenhum. Com tanta coisa gira à venda nas lojas, por meia dúzia de tostões, o
artesanato não é, infelizmente, valorizado hoje em dia. Fiquei assim com um montão de prendas giríssimas em casa. lolololol
Por
entre os afazeres de quem não tem dinheiro para gastar mas tempo tem de sobra,
decidi cobrir de crochet e frioleira endurecidos umas bolas de bilhar antigas,
que andavam aqui por casa.
Foi
então que tive uma epifania; ia dedicar-me à Arte Têxtil!
Isto
passou-se antes do último verão e estive até Setembro a produzir freneticamente, em
segredo total. Para além da parte manual propriamente dita, passei horas e
horas à frente do computador a estudar como se faz isto ou aquilo. Santo
YouTube!!! Quando não existia (ou era demasiado cara) a “ferramenta” para fazer
o que eu queria, inventava-a e construia-a eu. Assim, improvisei um tear com a
estrutura de uma tela, fiz lançadeiras, um utensílio para malha circular em Fimo e inventei
um tear circular utilizando um bastidor e molas de escritório. Deste
estou mesmo muito orgulhosa porque foi uma ideia de génio – modéstia à parte,
lol – que tem sido incrivelmente gabada por quem entende do oficio.
Até
que me ocorreu que talvez não fosse má ideia perguntar às pessoas o que achavam
pois, se o meu trabalho não tivesse aceitação, talvez mais valesse dedicar-me à
pesca…
Muito insegura e receosa das reacções, fui mostrando as minhas
obras a alguns eleitos por entre as minhas relações próximas. Todos afirmaram
gostar muito, mas apesar de tudo eram suspeitos, quem gosta de nós tende a
dar-nos palmadinhas nas costas, mesmo que sejam palmadinhas piedosas.
Resolvi
então criar a página do Facebook, para testar com malta teoricamente mais
isenta. Comecei logo a receber elogios incríveis, mais, e mais entusiásticos, confesso,
do que estava à espera.
Passei
também a utilizar a conta do Instagram, que tinha aberto quando este apareceu, mas
onde nunca mais tinha voltado a pôr os pés. Os seguidores têm vindo a crescer de dia
para dia, entre os quais alguns que são, para mim, verdadeiros “monstros
sagrados” deste tipo de artes. Imaginem como se sentiriam se fossem pintores,
por exemplo, e recebessem notificações a dizer “Picasso começou a seguir-te”,
“Salvador Dali fez-te um gosto”… (e se tivermos em conta que ambos estão
mortos, então, seria mesmo do além… lololol) O meu coração disparou.
A
partir daí foi a lócura. As coisas começaram a desenvolver-se a uma velocidade verdadeiramente
alucinante. Recebi encomendas, vendi quadros, fui convidada para expor numa
feira, candidatei-me a um concurso internacional de Arte Têxtil, fui mencionada
num blog, estou a preparar
workshops e fui convidada por uma galeria para fazer uma exposição individual em
Abril.
É tão, tão, tão, verdade, que até parece um
sino!!! Neste momento trabalho 7 dias por semana, dia e noite. Noite?! Sim,
trabalho durante o sono, resolvo questões técnicas, tenho ideias luminosas,
acordo a meio da noite e tomo notas. Levo o trabalho para todo o lado - olhem
aí a sorte de não fazer pintura a óleo ou esculturas em pedra, hehe – feltro na
lavandaria, teço nos consultórios, tricoto no carro enquanto espero por alguma
coisa. Ando
exausta, toda partida, tive tendinites, contraturas musculares, dores nas
costas, vista cansada... Se quiserem ter uma pequena noção do trabalhão que tudo
isto dá, vejam alguns dos “Making Of” no separador “fotos” da minha página do
Facebook.
Como
lá digo; “tenho o cérebro a mil e as mãos inquietas”! Tudo isto, movida pela
tal paixão que me faz minimizar todos os problemas e na esperança de nunca mais
ter de voltar a trabalhar com sacrifício, de não ter de voltar às “coisas
chatas” como diz uma amiga minha, porque, depois de ter experimentado esta
sensação, ia ser imensamente duro.
Se
julgam, no entanto, que está a ser fácil, que tudo são rosas, desenganem-se. Para
além de uma série de outros problemas que nos assombram a vida, neste momento o
agregado familiar está basicamente sem rendimento, estamos a viver da ajuda dos
nossos pais e de um pé-de-meia que felizmente temos. Mas não julguem que é uma
meia daquelas gigantes que se põem ao pé da lareira no Natal. Não, é uma
meiazinha pequenina que, de mês para mês, se vai desfiando até que, mais dia,
menos dia, não vai sobrar nada.
Manter-me
neste rumo requer de mim uma coragem que não pensei ter, acreditem. Quantas
vezes não me passou já pela cabeça desistir e ir trabalhar para uma caixa de supermercado
(forma de expressão, sem qualquer intenção depreciativa para quem cumpre essa
função) para ter um mínimo de segurança, para poder contar com um dinheirinho
fixo ao fim do mês. Para além disso, apostar tudo por tudo nesta minha nova
actividade, implica não só não procurar outro tipo de trabalho como,
inclusivamente, não o aceitar se me vier bater à porta. O dia só tem 24 horas,
não consigo dar uma no cravo e outra na ferradura.
A
parte mais maravilhosa de tudo isto é que, mais uma vez se prova, não somos
nada uns sem os outros. Acreditem, pois é a mais pura verdade, que sem todo o
apoio que tenho recebido já teria desistido há muito tempo. Não fazem ideia da
quantidade de vezes que já fraquejei, dos ataques de ansiedade que me assomam
regularmente, da insegurança que antecede a apresentação pública de cada peça…
aos outros, a todos aqueles que me têm apoiado, alguns com uma tenacidade
férrea, uma presença constante, devo o facto de me manter na perseguição deste
sonho.
Parece-me assim da máxima importância nomeá-los, reconhecer-lhes o
valor, atribuir-lhes a importância vital que têm neste momento para mim. Compreendi
finalmente aquela lista interminável de nomes que eles leem na entrega dos
Oscares, e dou graças por não me poderem mandar calar com a musiqueta. ;)
Quero assim agradecer, antes do mais, aos da casa, evidentemente. Ao meu filhote e cara-metade,
pela paciência para me aturarem nesta fase em que ando meio alucinada. Pelos
“já vou, dá-me só mais cinco minutos” que acabam sistematicamente por se
transformar em horas, pelas refeições tardias e às vezes já meio queimadas,
pelas frequentes secas que levam no carro quando vou comprar materiais. Ao Zé, especificamente,
pelos pequenos favores que lhe estou sempre a pedir, pela ajuda extra nas
tarefas caseiras, por aguentar as pontas quando é necessário.
Depois,
à minha família, começando pela minha mãe, que gaba o meu trabalho a toda a
gente nitidamente a rebentar de orgulho. Sempre pronta a ajudar no que pode,
quer física quer financeiramente, que me passa roupa a ferro para me libertar o
tempo e me compra reconstituintes quando estou a cair par o lado de
cansaço.
Aos
meus irmãos, meus fãs incondicionais, que não se cansam de me gabar o talento e
de dizer que acreditam que foi desta que acertei de vez.
A
uma das minhas tias que, de cada vez que fala comigo, seja por que razão for,
aproveita sempre para me dar os parabéns pelo meu trabalho, que segue de perto,
e acreditem que esta não é público fácil, é do mais exigente que há.
Aos
que se deram ao trabalho de me telefonar ou enviar mensagens pessoais de
incentivo, tentando incutir-me confiança, tecendo elogios que me puseram a
lagrima ao canto do olho.
Aos
que me compraram ou encomendaram peças, com especial relevo para uma que
diariamente me apoia, manda força quando sente que me estou a ir abaixo, gaba e divulga regularmente
as minhas obras.
À
Diana, por me ter contratado para a ajudar num projecto da Oficina 166, proporcionando-me uma bolhinha de ar financeira a fazer aquilo que gosto
durante o mês de Novembro e por agora me ter convidado a lá fazer workshops. Já
sem falar da sorte que tive em conhecer uma pessoa extraordinária como ela.
Á
Sofia, pelo magnífico elogio no Passei e Gostei, que me fez sentir que o ano começava em
beleza. Bem hajas, Sofia!
Às MAO, genericamente, o grupo mais incrível e
dinâmico ao qual já me adicionaram no Facebook (obrigada, Madalena), pelos tão
importantes Likes à página e às peças, e mais especificamente a todas aquelas
que se deram, para além disso, ao trabalho de me enviar mensagens privadas.
À
Isabel pela oportunidade de fazer uma mini-reportagem sobre o meu trabalho para
o De outra maneira.
E estou agora para aqui a tremer, perguntando-me se terei deixado algum agradecimento importante de fora… Enfim, agradeço a todos os que de
alguma forma, por alguma via, me têm apoiado e ajudado. Podem ter a certeza
absoluta que, se alguma vez for alguém, a vocês o devo, sem a mais pequena
sombra de dúvida. Bem hajam!!!
Amanhã faço 53 anos e, de certa
forma, tenho a sensação de estar agora a começar a minha vida… sensação
estranhamente empolgante, confesso.
COM MÚSICA
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