quarta-feira, 25 de julho de 2007

Realidades alternativas

No passado fim de semana, estivemos com um casal que foi carinhosamente apelidado por nós de "casal alternativo"... ; )
São pessoas doces, calmas, com um ar sereno e pacífico.
Levaram o "carimbo" de alternativos devido a ideias várias que foram partilhando connosco.

Só para terem uma ideia do que estou a falar;
Tiveram a terceira filha em casa (assistidos por uma parteira e uma doula) e fazem a apologia do parto natural, em ambiente reservado, fora da confusão e desumanização dos hospitais.
Não vacinam os filhos, apostando nas imunidades naturais.
Têm um pediatra tradicional e um medico alternativo a seguir as crianças. Costumam consultar os dois e optar pelo conselho que lhes pareça fazer mais sentido.
Em tudo, aliás, confiam na intuição.
Não se assumindo como vegetarianos, macrobióticos, etc, têm um extremo cuidado com a alimentação, estudando sobre o assunto e pondo em pratica no dia a dia o que vão aprendendo.
Acreditam que se os pais estiverem bem as crianças estão bem, não parecem preocupar-se com as pequenas contrariedades do dia a dia.
Os miúdos andam "à solta", sem grande controle ou limitações da parte dos pais.
Enfim... não vou continuar a descreve-los ad eternum...

A certa altura, comentaram o facto de a Europa ser "a Disneylandia do Mundo". Diziam que a maior parte de "nós", com os nossos frigorificos, telemoveis, carros, supermercados, etc... não se dá conta de como a esmagadora maioria "do resto do mundo" vive, em que precárias condições.
E ficaram com um ar triste, angústiado, culpado quase de terem aquilo a que esses outros não têm acesso...

Lembrei-me logo de um livro que li há tempos, "A flor do deserto", de uma senhora chamada Waris Dirie. Nasceu na Somalia, numa família nómada e fugiu para a "Disneylandia do mundo" tornando-se manequim profissional.
Foi submetida a uma excisão quando tinha cinco anos e luta hoje activamente contra a mutilação sexual feminina.
A sua infância não teve, sem dúvida, rigorosamente nada a ver com a dos nossos filhos.
O seu presente deve ser bastante semelhante (talvez com uns euritos a mais na conta LOL) ao de qualquer um de nós.

Não tenho qualquer dúvida de que, se tivesse de voltar à vida que levava na Somália, seria profundamente infeliz. A questão é... será que o era enquanto lá estava?
Dir-me-ão "claro que sim, senão não se tinha pirado"... ou "estás-te a passar ou quê? Excisão??!!! Hello??!!"
Não, ainda não estou completamente estúpida e não era obviamente disso que estava a falar...
Ela fugiu porque não se queria casar com um velho que o pai lhe arranjou. E não há qualquer hipótese de eu defender que a excisão possa trazer qualquer tipo de felicidade...
Mas enquanto nada disto aconteceu?
Nasceu "em casa" (que é como quem diz na moita), não foi vacinada, não comia "porcarias ", vivia em liberdade, na natureza, no meio dos animais...
Enfim... suponho que estejam a ver onde quero chegar... ; )

Aquela criança não conhecia mais nada, não tinha termo de comparação. A vida dela era "aquilo", uma existência muito básica. Viveu uma vida dura (com três anos já ia pastar rebanhos, por exemplo), difícil, mas que não descreve como sendo "horrível", até lhe acontecer o que aconteceu e que despoletou a fuga...
Este tipo de realidade, em que vive grande parte do mundo, tem muito em comum com aquilo a que aspiram "os alternativos". Comunhão com a natureza, regresso a uma existência mais básica (no bom sentido), mais desprovida dos malefícios da sociedade moderna, dos corantes, dos conservantes, das microondas, da poluição, do stress...

Não estou de forma alguma a defender a miséria, a fome, as guerras ou as excisões... não estou a dizer que não haja pessoas a viver de forma sub-humana... só que há realidades alternativas sim, mas que não são obrigatoriamente tão más como possam parecer à primeira vista.

Quando andava no liceu, namoradeira como era, tinha uma "rival"... uma miúda giraça, com boa pinta, inteligente, muito cobiçada pelos meninos... Não me lembro se alguma vez lhe dirigi a palavra...
Há tempos "reencontrei" essa miúda, que já não é miúda nenhuma mas uma velha como eu (LOLOLOLOLOLOLOLOL) e tornámo-nos amigas.
Descobri então que, enquanto eu saltava alegremente de nenúfar em nenúfar, numa adolescência preocupada exclusivamente com coisas perfeitamente idiotas, ela tinha ficado sozinha em casa com uma mãe abandonada pelo marido, depressiva e alcoólica, que não conseguia tomar conta dela própria quanto mais de uma filha... Era esta que tomava conta da casa, que limpava, que cozinhava, que se preocupava com as contas por pagar...
A sua auto estima estava tão em baixo que nem se dava conta de que tinha direito ao título de rival, de que era apreciada, gabada, invejada... Pudera!
Esta rapariga andava, como já disse, no mesmo liceu que eu, tinha a minha idade, era do mesmo extracto social... e no entanto... que realidades tão diferentes!

A tendência, quando se fala em sofrimento humano é "ir" para zonas de fome, de guerra, de tortura. Mas até na porta ao lado existem realidades alternativas. E estas não têm obrigatoriamente a ver com questões sociais...
Temos os nossos filhos em casa, saudáveis e felizes e há pais que "vivem" nos hospitais, com crianças doentes, deficientes, moribundas... não é preciso ir a um hospital em África para ver miséria humana.

Não digo que devamos apoiar os lobbys das farmacêuticas, a corrupção, a exploração humana, as injustiças sociais ou as guerras... Mas também não me parece muito sensata esta obsessão com "a miséria do terceiro mundo". Em todo o lado há pessoas a viver nas piores situações imagináveis, em todo o lado há sofrimento... sofrimento físico, sofrimento psicológico. Que tal começarmos por olhar para a casa ao lado?






segunda-feira, 2 de julho de 2007

Carpe Diem... the big picture

"Carpe Diem"... desde que vi o Clube dos Poetas Mortos (confesso que antes não conhecia) que sinto uma ligação muito forte com estas palavras...
Segundo pesquisei na Net: "Carpe Diem" quer dizer "colha o dia". Colha o dia como se fosse um fruto maduro que amanhã estará podre. A vida não pode ser economizada para amanhã. Acontece sempre no presente."
É um sábio conselho que para mim faz todo o sentido...

Desde há muito tempo que tenho intuitivamente uma clara noção da efemeridade da vida.
A realidade é que grande parte das vezes a morte não se faz anunciar... Num dia estamos por cá e no seguinte quem sabe onde estaremos. Bem diz "ele o povo" (LOL), "vive a tua vida como se não houvesse amanhã, um dia acertas".

Notem que falo em morte mas poderia falar em doença, enfermidade ou qualquer outra fatalidade daquelas que nos "revolucionam" a vida... para drasticamente pior, claro está.
E não só a nossa vida... também a dos que nos rodeiam nos afecta, dos nossos pais, dos nossos filhos, dos nossos irmãos, dos nossos amigos...
Quando nos despedimos de alguém não sabemos se o voltaremos a ver, ou em que estado. Mais vale aproveitar em pleno os momentos que passamos juntos.

Mesmo sem recorrer a ideias tão dramáticas, a realidade é que a vida não pára, não recuperamos o tempo que "perdemos". Se não aproveitar-mos o dia a dia para fazermos algo por nós, pela nossa vida, pela nossa qualidade de vida, pela nossa felicidade, um dia acordamos e a vida passou-nos ao lado. As inercias, as preguiças,
os medos de fazer aquilo que sabemos querer fazer, trazem-nos frustração no presente e desânimo conforme este se vai transformando em passado. "Não deixes para amanhã o que podes fazer hoje..."
É do presente que se constrói um passado, não do futuro.

Não estou de forma alguma a fazer a apologia do "não olhes para a frente, sê inconsciente, não faças planos, não tenhas objectivos"... Tudo o que fazemos hoje terá sem dúvidas implicações amanhã e isso tem obviamente de ser ponderado. Isto tanto é válido para o comer um quilo de cerejas que nos vão provocar uma real caganeira como para o despedirmo-nos do emprego.

Agora se "colhermos o dia como se fosse um fruto maduro que amanhã estará podre", se tivermos noção de que o que de bom temos hoje pode já lá não estar amanhã, isto ajudar-nos-à a fazer as opções mais "correctas". E "o que de bom temos hoje" pode ser a nossa juventude, a nossa saúde, a nossa autonomia, a nossa própria vida. Não devemos "perder tempo" com caminhos que nos "fazem mal". Se não estivermos com pressa, porque havemos de escolher a autoestrada em vez de ir pela marginal a ver o mar?

Mas para além do "carpe diem", do "colher o dia", do aproveitar ao máximo o que de bom a vida tem para nos dar, há mais uma razão para vivermos HOJE...

Todos nós temos problemas, assuntos para resolver... dúzias deles, pequenos, grandes, médios...
Muitos deles não podem ser resolvidos "na hora", implicam tempo, trabalho, paciência... não se fazem, vão-se fazendo... Ora isto ás vezes é absolutamente desesperante...
Eu que o diga que ando há anos a lutar contra a minha pelintrice, por exemplo... LOL

O que quero dizer é que quando se olha para o "big picture" às vezes é realmente assustador... Vemos uma montanha à nossa frente, cheia de obstáculos a ultrapassar e falta-nos o folego...
O viver o hoje, um dia de cada vez (como os alcoólicos anónimos), um passo de cada vez, permite-nos manter as forças. Ou pelo menos não as desperdiçar.

Para começar, o dia só tem 24horas, quer queiramos quer não, e "Roma e Pavia não se fizeram num dia"... Não vale portanto a pena querer "meter o Rossio na Rua da Betesega". (esta foi só para os curiosos como eu, que não sabia onde era a porcaria da rua... LOL) E mais, "grão a grão enche a galinha o papo"... LOLOLOLOLOL
Falando sério... (juro que não bebi nada, é mesmo só estupidez natural...) temos tendência para ver os ditos problemas (ou coisas a resolver) como um todo, o que no fundo não está errado. A realidade é que a maior parte das vezes estes têm de ser resolvidos por etapas, um pé à frente do outro, um passo de cada vez. Não há teleportes infelizmente. Ora se continuarmos a olhar para a montanha desesperamos.

As coisas estão sujeitas a tempos de reacção, reacção nossa, reacção dos outros. Se estivermos sempre a "jogar xadrez", a antecipar mentalmente as situações, a tentar visualizar todas as hipóteses, a querer prever tudo o que possa acontecer e tudo o que poderemos fazer a esse respeito, damos em doidos.

A ideia é portanto escolher um rumo e ir seguindo a bússola... calmamente, lidando com o que se nos vai deparando pela frente, as tempestades, a bonança, os ventos contra ou a favor... e já agora ir apreciando a paisagem : )
Carpe Diem !