terça-feira, 23 de setembro de 2014

Ó vizinha, dá-me salsa?!




Um destes dias os nossos convidados para o almoço entraram-nos em casa a perguntar; “Como é que vocês se dão com os vossos vizinhos tal tal? É que estamos a pensar fazer uma queixa…”
Depois de lhes assegurarmos que dávamos muito bem obrigados e sugerirmos que estivessem quietinhos, continuaram a refilar. Que não podia ser, que as pessoas não podiam fazer o que lhes dava na real gana, que eles faziam queixa de tudo, eram odiados por todos os vizinhos mas funcionava muito bem.

Primeiro chocou-me a ideia daqueles dois serem odiados por fosse quem fosse. Não conheço sinceramente melhores pessoas, mais atenciosas, disponíveis, prestáveis, sempre dispostos a estender a mão ao próximo. Pessoalmente não conheço ninguém que não os adore.
Depois pus-me no lugar dos vizinhos deles e, se de facto é a postura que adoptam, compreendi que possa haver quem não tenha propriamente a mesma opinião… lol

A conversa transitou entretanto para outro tema qualquer e não voltámos a discutir o assunto. Fiquei no entanto a remoê-lo durante algum tempo, ao ponto de me inspirar este post…

Vivemos num pequeno caracol com trinta casas, das quais dois terços são praticamente iguais, só diferindo em tamanho. Chamo-lhe caracol porque é o que parece visto de cima, tendo de se sair por onde se entrou, o que faz com que seja uma rua muito calma e recatada praticamente só por cá circulando moradores e respectivos colaboradores e visitas.

Se me perguntarem se aquilo que os irritou a eles não me incomoda a mim, tenho de confessar que sim. Como em qualquer outro sítio onde vivesse, há praticas que me chateiam, coisas que agridem o meu sentido estético, episódios pontuais que não me agradam.
Daí a “fazer queixa” dos mesmos…

Quando as nossas visitas juntaram numa mesma frase a afirmação de que eram odiados à de que corria tudo muito bem, confesso que fiquei baralhada, pois a mim parece-me sintoma de que algo corre infelizmente bastante mal.
Eu pelo menos atribuo uma enorme importância ao ambiente em que vivo, acho fundamental sentirmos harmonia à nossa volta e não animosidade.
Gosto de trocar dois dedos de conversa com os vizinhos quando nos cruzamos na rua, de me sentir à vontade para lhes cravar isto ou aquilo e vice-versa, de lhes poder deixar a chave de nossa casa se for necessário, etc…
A minha irmã é muito amiga dos vizinhos do lado, fazem jantaradas, passam férias juntos, confesso que tenho uma pontinha de inveja, gostava de ter uma coisa do género aqui na zona. lol

Se pensarmos bem, todos temos coisas a apontar, todos de alguma forma temos  telhados de vidro (no nosso caso até em sentido próprio…lolololol), duvido que alguém possa afirmar, em consciência, que jamais incomodou o próximo.
Resumindo, acho fundamental esforçarmo-nos por ter para com os outros a paciência e tolerância que gostaríamos e esperamos que tenham para connosco.

Queixas, reservo-as para se surgir alguma questão realmente grave, nos entretantos prefiro uma boa vizinhança… :)







COM MÚSICA
(Sim, sim... mas foi a única música gira 
que encontrei sobre vizinhanças, ok? lol)
Pete Seeger - Little Boxes

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terça-feira, 9 de setembro de 2014

Sem stress…


Na semana passada tive de ir fazer uns exames e aproveitei para a seguir passar no Ikea. Cada vez mais me sinto uma pacóvia quando me desloco à metrópole, percebi finalmente porquê.

No consultório, as senhas de vez encravaram na máquina, o que gerou uma relativa confusão no atendimento. Algumas pessoas desatinaram com a senhora que estava ao balcão, esta reagiu de forma ríspida e desagradável. Num instante se criou ali um ambiente pesado, sem grande razão de ser dado que na realidade ninguém acabou por perder nem tempo nem vez.
Na caixa do Ikea abandonei o carrinho durante uns segundos para ir buscar um saco para as compras e não uma mas duas famílias me passaram à frente. Pressenti que tentar recuperar o meu lugar na fila iria provocar um verdadeiro pé de vento, fiquei-me.
Finalmente, no estacionamento, um senhor por pouco não me abalroou em marcha atrás por ter surgido outro carro, também ele a galar o lugar de onde estava a retirar o meu. Notem que havia outros alguns metros mais à frente. Quando passei por ele ainda vociferou na minha direcção.

No regresso a casa vinha a pensar no assunto e dei-me conta que levo uma vida com muito pouco, para não dizer praticamente nenhum stress.
Tenho problemas e preocupações, lido com dificuldades e contrariedades, sinto dor e tristeza, às vezes ansiedade ou angústia… mas a realidade é que o stress raramente “me assiste”.
Sempre funcionei muitíssimo mal sob pressão, como tal sempre fugi dela como da peste e tento erradica-la da minha vida em tudo o que me é possível. 
Isto não se faz sem custos, sem abdicar de determinadas coisas, muitas delas directamente ligadas ao lado material. Permite-me no entanto, em certa medida, escapar a esta calamidade da vida moderna. 

Durante a vida académica, por exemplo, é comum trabalhos e estudo serem deixados para a última hora. A maior parte dos meus coleguinhas adiava o inevitável até aos limites, alguns deles afirmando inclusivamente ser muito mais produtivos desta forma. Eu sempre tive a atitude contrária, despachando logo o que houvesse a despachar, para poder relaxar a seguir.
O facto de ser naturalmente responsável e organizada permite-me adoptar quase que inconscientemente esta postura. Não deixa no entanto de ser necessário um trabalho consciente, quando as coisas não dependem de nós, no sentido de aprender a evitar tensões desnecessárias.

Assim, quando tenho de estar em algum lado a uma hora certa, por exemplo, dou um desconto para imprevistos e saio um bocado antes do que estimo ser necessário para lá chegar. Quando planeio e organizo o meu dia-a-dia, faço-o de forma realista, não tentando meter o Rossio na Rua da Betesga.
Tenho também vindo a aprender a não assumir os atrasos alheios, se a responsabilidade não é minha, descontraio, relaxo, o mesmo se passando quando fiz ou estou a fazer tudo o que esteja ao meu alcance para tratar de determinada situação, mesmo que ainda não esteja resolvida.
Basicamente cheguei à conclusão que preocupar-me não resolve absolutamente nada e stressar ainda menos. No que me respeita só serve mesmo para me diminuir as capacidades, provocando inevitavelmente desfechos negativos. Para além disso sinto nitidamente que me envenena, me corrói a qualidade de vida de uma forma inaceitável.

Mas, mais uma vez nenhum homem sendo uma ilha, não basta tentarmos cortar no nosso stressezinho pessoal. Se quisermos realmente um mundo melhor, é preciso que também nos coibamos de o mandar para cima dos outros.
É essa nuvem negra, essa tensão, que se sente na rua, no trânsito, no atendimento em geral, que me incomoda quando me desloco hoje em dia a Lisboa e me faz sentir como se vivesse na província. Aqui não se sente de todo com o mesmo peso, e notem que não vivo propriamente no Alentejo profundo, demoro menos tempo da minha casa ao Marquês do que alguém que more nos Olivais…

Já devem conhecer a definição de segundo; o tempo que demora entre o sinal passar para verde e o fdp que está atrás de nós começar a buzinar… ;)
Ouvi sensivelmente as mesmas buzinadelas desde que cá estou, há nove anos, do que num só dia mais complicado na capital. Simplesmente não se usa, não é hábito, não é comum.
Assim, eu que era uma buzinadora de primeira, deixei também de o fazer. Apito para alertar sobre algum perigo e, confesso, volta não volta com uns palavrões à mistura, como sinal de protesto se alguém faz asneira da grossa. Não enterro a mão na buzina para apressar as pessoas.

Na vida profissional,  é sempre tudo “para ontem”. No entanto, quantas vezes não exigem prazos que obrigam a trabalhar à noite, ao fim de semana, para depois ficar tudo não sei quanto tempo em águas de bacalhau… “para ontem”, tirando raras excepções, casos de força maior, é um timming absolutamente obsceno, se era para ontem tratassem do assunto anteontem.
Pessoalmente, tento sempre não pressionar ninguém quando não estou efectivamente com pressa. É muito curioso sentir o misto de espanto e alívio, quando alguém se está a desfazer em desculpas devido a alguma demora, e lhes respondemos sinceramente “não tem problema, esteja à vontade”. Até parece que ouvimos o chiar da descompressão… lol

A vida actual parece uma corrida contra o tempo, andamos sempre a mil. Não tem no entanto de ser sempre assim, muitas vezes fazemo-lo porque não trocamos de mudança, de registo. Corremos e pressionamos os outros a fazê-lo por “defeito”, porque é aquilo a que estamos habituados. 
Basta no entanto que cada um de nós abra os olhos e desacelere um bocado, que lute activa e conscientemente contra este estado das coisas, para que tudo mude. 
Infelizmente, como em tantas outras coisas, a maioria encolhe os ombros e decreta que não há nada a fazer.

COM MÚSICA

Platters - Sixteen Tons


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