terça-feira, 26 de maio de 2015

Marcas d’água



As relações humanas são provavelmente, para mim pelo menos, a coisa mais importante na vida.
Não me imagino a viver sem amor e carinho, sem humor, sem apoio e entreajuda, sem troca de ideias ou partilha de experiências…
Tenho, talvez por isso, uma memória emocional de elefante.
As datas e os factos, os porquês e os detalhes, esfumam-se-me na mente mas dificilmente me esqueço de como alguém me fez sentir.
O instinto de sobrevivência e o absoluto prazer em ser feliz, levam-me a afastar de tudo o que me faz mal, atirando para trás das costas aqueles que me fizeram essencialmente sofrer.
Os outros, independentemente de eventuais quezílias que possa ter havido pelo caminho, transporto-os para sempre no coração, quer tenham sido namorados ou amigos, colegas ou professores, colaboradores ou vizinhos…

Assim, quando reencontro alguém que, de alguma forma, fez parte da minha vida, sinto-me como se o tempo não tivesse passado.
Se de um “mau” se tratar, afasto-me prudente e discretamente, reduzindo a interacção ao inevitável.
Se, pelo contrário, se tratar de alguém que tenha deixado uma marca positiva na minha vida, continuo a sentir a mesma empatia, a mesma cumplicidade, a mesma intimidade.
É aqui que a porca torce o rabo, pois raramente sou correspondida.
Neste tipo de situações sinto-me como um cachorrito acolhendo o dono depois de uma longa ausência, salto, gano e dou ao rabo, numa excitação, à espera de festas, à cata de reconhecimento e afecto, recebendo no entanto geralmente em troca um distanciamento reservado, uma indiferença polida. 

O expoente máximo desta sensação foram os meus 50 anos, durante uns tempos hesitei entre não fazer absolutamente nada, deixando passar a ocasião em branco ou celebra-los, de alguma forma diferente do habitual.
Cinquenta anos, meio século, bodas de ouro da vida… se há data gira para se festejar, na minha opinião, é mesmo essa e achei que se não o fizesse me iria arrepender.
Decidi assim seleccionar as 50 pessoas que, de alguma forma, em algum momento, cruzaram a minha vida, com quem me apetecia realmente partilhar esse marco.
Foi um exercício engraçado, mais difícil do que estava à espera… 50 pessoas é muito e é pouco, são demasiadas para o núcleo duro mas é extremamente limitativo quando alargamos o horizonte da escolha...
Adivinhem então quem esteve presente?! Grosso modo, aqueles com quem partilho actualmente a minha vida, os que são, hoje em dia, convidados para qualquer evento de relevo.
Os que tentei ir buscar ao passado baldaram-se ou, pior ainda, nem sequer se deram ao trabalho de responder ao convite.
Apesar da postura “cool” que tentei ostentar para o exterior, se vos dissesse que não doeu, estaria a mentir. As inúmeras ausências fizeram-me sentir pequenina, insignificante. Fizeram-me acima de tudo pensar que não tinha tido qualquer peso, qualquer importância, qualquer relevância, nas suas vidas.

Acredito que a auto comiseração seja uma tendência natural do ser humano, somos todos instintivamente Calimeros, se não lutarmos contra isso. Assim, de cada vez que me deparo com uma destas situações de afastamento emocional, penso que o “problema” é meu. Sinto que não deixo senão marcas d’água no coração dos outros, marcas que desaparecem com o tempo, não ficando senão uma muito ténue lembrança do que existiu entre nós.
A realidade é que a própria vida não passa de uma marca d'água, tudo é efémero,  a vida é hoje, é aqui, é agora e consciente ou inconscientemente é no que as pessoas investem, é ao presente e a tudo o que dele faz parte que se entregam.
Qualquer um de nós tem muito menos importância do que gosta de acreditar e as marcas que eventualmente deixamos nos outros têm muito mais a ver com eles próprios do que connosco. 





COM MÚSICA

sexta-feira, 15 de maio de 2015

Os filhos e o Facebook


Alguns putos não querem os pais como “amigos” no facebook.
Muita gente acha isso normalíssimo… eu não, acho que é sinal que algo está errado.
Todos, na minha opinião, temos direito aos nossos “jardins secretos”, acontece que o facebook é um “jardim público”.

Já aqui falei várias vezes sobre as redes sociais e afins, que continuo e continuarei a defender por considerar que trazem, apesar de tudo, mais coisas positivas do que negativas.
Há entanto, sem dúvida, muita gente completamente baralhada sobre o assunto.

A “barreira do computador” faz com que muitos tenham online comportamentos idiotas, imprudentes, inadequados, etc, esquecendo ou ignorando as regras básicas do convívio em sociedade.
Tendem, por outro lado, a esquecer-se que estar online é mais ou menos como estar no meio da rua e que tudo o que “postarem” pode, potencialmente, ser visto por qualquer um.

Dito isto, o que leva um filho a não querer que os pais tenham acesso à sua página?! Das duas uma, ou o seu comportamento ou o deles.
Ou seja, ou não querem que os pais vejam o que lá põem, por terem noção que poderá, na sua opinião, ser criticável, ou têm medo do que os próprios pais lá possam deixar.

No primeiro caso, ou têm pais particularmente rígidos ou postam de facto coisas que não deveriam, com os pais “a ver” ou sem eles.
Parece-me fundamental que tanto miúdos como graúdos, compreendam que as regras comportamentais da vida virtual são exactamente as mesmas que as da vida real e que não devemos fazer na nossa página nada que não fizéssemos noutro lado qualquer.
É mais do que evidente que a atitude de cada um muda consoante a pessoa que tem à frente ou o grupo onde está inserido no momento. Não falamos da mesma forma com avós e amigos, com professores e colegas, crianças e adultos, etc…
As redes sociais não são no entanto equiparáveis ao nosso quarto ou ao canto do recreio da escola, são “via pública”, é preciso ter noção disso.
Para uma audiência selecta existem os chats, as mensagens privadas, os emails… ou inclusivamente as próprias ferramentas de selecção do Facebook, que a maior parte desconhece ou não domina.

Suspeito no entanto que a segunda razão tenha em muitos casos tanto ou mais força do que a primeira. Há pais que não têm noção de como pode ser embaraçante para os filhos o seu comportamento online. Quem não foi já parar a uma página de exemplos disso?! 
Teoricamente, se tem têm conta no Facebook, estes já não serão propriamente crianças pequenas e, como todos sabemos, não há quem se embarace com mais facilidade do que os adolescentes.
Se acharem que os pais possam vir a ter uma presença invasiva, mais facilmente farão um pacto com o diabo do que aceitarão a sua amizade.
Fazer like a tudo o que colocam online ou encher-lhes a página de merdas não é ok, fá-los parecer meninos da mamã (ou do papá). Dar-lhes descascas públicas relativamente a algum post, também raramente é boa ideia, se temos alguma coisa a dizer, façamo-lo em privado sem os humilhar. Ir cuscar quem são os seus amigos e tentar sacar nabos da púcara ou, pior ainda, pedir-lhes amizade, é no mínimo controlador.
Enfim… não são só os filhos que se "portam mal”, há mil e uma coisas que os pais podem fazer que justificam que eles nos queiram à distância.

Voltamos assim à mesma conversa de sempre, a vida online não é diferente da vida real, as regras são as mesmas, o bom senso deve imperar e cá estamos para aprender uns com os outros. É nisto que se baseiam os relacionamentos saudáveis. ;)

COM MÚSICA

quarta-feira, 6 de maio de 2015

Don’t worry, be happy



Há pessoas que são naturalmente “cool”, que parecem saltar levemente de nenúfar em nenúfar, sem aparentemente se preocuparem com grande coisa. Confesso que tenho uma certa inveja, a maior parte de nós tende a preocupar-se com alguma regularidade.
Preocupamo-nos connosco e com os outros, com o mundo que nos rodeia e com o estado do mundo em geral, com questões de dinheiro, de trabalho, de saúde, de relacionamentos… motivos para preocupação geralmente não faltam.

Esta não passa no fundo de uma espécie de medo, preocuparmo-nos com algo é temer um potencial desfecho negativo da questão.
Consome-nos, gera angústia, ansiedade, mau estar, sofremos por antecipação, frequentemente com coisas que nem sequer chegam a acontecer. Como se costuma dizer “até ao lavar dos cestos é vindima” e quantas vezes as situações não têm desfechos bem diferentes dos previstos.

Por outro lado, dá ideia que as pessoas acham que preocuparem-se é sinónimo de gostar,  demonstrar empatia, interesse pelos outros ou pelas situações. Como se o facto de sofrermos, só por si, mudasse alguma coisa, como se fosse de alguma forma ajudar.
A realidade é que, relativamente a grande parte das coisas que normalmente nos preocupam, não há geralmente grande coisa que possamos fazer.

Não deveríamos deixar que as preocupações passassem de sinais de alerta, sendo rapidamente descartadas.
Das duas uma, ou está ao nosso alcance fazer alguma coisa, em cujo caso devemos arregaçar as mangas cruzando os dedos para que corra tudo bem, ou foge completamente ao nosso controle e a nossa preocupação não servirá absolutamente para nada.
Basta pensarmos para concluirmos que preocuparmo-nos é das ocupações da mente mais inúteis e contraproducentes.

Tal como tantas outras coisas na vida, é sem dúvida muito mais fácil dizer do que fazer.
Não só consideramos as preocupações naturais, estando completamente habituados a tê-las e a que os outros as tenham à nossa volta como, se não a demonstrarmos perante determinadas situações, seremos considerados insensíveis, inconscientes, etc…

Sou pessoalmente uma pessoa tendencialmente preocupada sofrendo imenso com isso.
Sou, felizmente, por outro lado, extremamente aberta à lógica e à razão, acreditando que está nas nossas mãos mudar, até o que “sempre foi assim”, e que o devemos fazer ao longo de toda a vida, por forma a ir ganhando cada vez mais serenidade e paz de espírito.

Quando me apercebi que as preocupações nos tiram qualidade de vida, em troca de absolutamente nada, comecei uma árdua campanha. A luta não tem sido fácil mas tenho ganho várias batalhas e tenho fé de poder ganhar a guerra.
Que nem testemunhas de Jeová, continuam a bater-me à porta, como sempre fizeram, mas agora já aprendi que é ok dizer não, que não preciso de as ouvir, de lhes prestar atenção, de gastar com elas o meu precioso tempo.

Comecei por tentar banir a palavra do meu vocabulário, é um truque que uso frequentemente como guia para aquilo em que acredito. Fiz o mesmo com as palavras “sempre” e “nunca”, por exemplo, ou com a afirmação “tens que…”. Se modelarmos o nosso discurso estaremos simultaneamente a moldar a nossa mente.

Funciona igualmente bem substituir “preocupação” por “miúfa” ou equivalente... lol ... é muito mais nobre, muito mais digno, estar-se preocupado do que completamente acagaçado, ninguém gosta de se assumir como mariquinhas, para além de que põe logo as coisas em perspectiva.

Depois, quando alguma preocupação me assalta, tento sempre compreender se está nas minhas mãos fazer alguma coisa.
Como em tudo, o grande desafio está na “sabedoria para perceber a diferença”.
Se chego à conclusão que não, compenetro-me de que  o meu sofrimento não servindo qualquer propósito o melhor mesmo é po-lo para trás das costas.
Senão, meto mãos à obra, “esperando o melhor e preparando-me para o pior”.

A questão do tempo é também essencial, a maior parte das coisas não se resolvendo do pé para a mão, estando sujeitas a timings e compassos de espera.
Há assim que viver o aqui e agora, tirar folga do que nos preocupa e respirar fundo. Mudar a cabeça para outro lado, naqueles momentos em que não há nada a fazer, por forma a poupar forças.

Preocuparmo-nos com dinheiro não nos torna ricos, preocuparmo-nos com a saúde não nos torna saudáveis… só infelizes.
Don’t worry, be happy! ;)

COM MÚSICA