terça-feira, 29 de agosto de 2017

Trinta anos...

Foto da esquerda de Pedro Ferreira - Foto da direita de Miguel Gago

   Não sou uma pessoa fotogénica, sou demasiado expressiva, nos instantâneos costumo geralmente ficar com um olho meio fechado ou a boca à banda, raramente gosto de me ver. No entanto, nos meus tempos do ARCO, costumávamos fotografar-nos uns aos outros e fiz muitas sessões, tanto atrás como à frente da câmara, tendo aprendido a não me deixar intimidar por ela.
   Recebi, recentemente, uma série de fotos minhas de há trinta anos, algumas das quais não conhecia, ou pelo menos não me lembro de ter visto. Inútil será dizer que foi um prazer reencontrar aquela que fui há tanto tempo atrás, ainda para mais captada pela lente de um fotografo fantástico. Estão todas muito giras e tecnicamente boas, mas a que aqui publico tocou-me profundamente, pois nela o Pedro conseguiu retratar-me a alma. Ao olhar para ela revejo, com uma nitidez incrível, a miúda que era aos vinte e dois anos.
   Esta foto parece retirada de um film noir. A primeira coisa que me saltou à vista foi a melancolia do olhar, não retrata nitidamente uma pessoa feliz. Por esta altura tinha já uma boa dose de vida complicada pelas costas. Aos dezanove anos, num acto de rebeldia, saí de casa e fui viver com o meu professor de filosofia e encenador do grupo de teatro do liceu, que me fez a vida num inferno durante três anos e tal, tendo, já no fim da relação, acabado por enviuvar. Juro que não fui eu que o matei.  Nela vejo uma miúda sofrida, mas não quebrada, cansada, mas não derreada. Naquele olhar sinto uma estranha mistura de dureza e doçura. A postura é quase desafiadora, como se perguntasse à vida com o que me iria presentear a seguir. Estava no auge da minha sexualidade, da minha sensualidade o que transpirou evidentemente para a foto, no entanto, na minha opinião, de forma discreta e pouco agressiva. Numa imagem em que me apresento num body de renda preta é, curiosamente, a cara que mais me chama a atenção.
   Há muitos anos que não fazia uma sessão fotográfica e dei por mim a pensar no que apareceria agora no papel. Lembrei-me daquelas fotos, muito em voga hoje em dia no Facebook, que recriam imagens antigas, e decidi desafiar o Miguel para esta brincadeira, para captar a pessoa que sou com trinta anos de vida em cima. O Miguel não me conhece como o Pedro conhecia, mas escolhi-o porque é, sem qualquer sombra de dúvida, um excelente caçador de almas. Nos últimos tempos tem fotografado muitos eventos, muitos encontros, e quase sempre consegue magnificamente captar a essência de cada um.  
   Foi uma tarde muito divertida, em que tirámos, evidentemente, muitíssimas mais fotos do que a que aqui apresento. Ambos considerámos que esta era a que mais ia ao encontro do objectivo, a que melhor transmitia aquilo que sou hoje. Tal como esperava, acho que também o Miguel me conseguiu aqui capturar a essência.
   Ao ver estas novas fotos veio-me imediatamente à cabeça a musica que escolhi para este post; La femme qui est dans mon lit, na plus vingt ans depuis longtemps…” O tempo passou, gastou, deixou marcas. Gosto, no entanto, sem a mínima sombra de dúvida, muito mais do ser agora retratado. Encaro a outra com alguma saudade da juventude, como é natural, mas sem nostalgia e dou graças por aquela pessoa ter ficado para trás.
   Através das fotos antigas, que agora recebi, descobri que afinal, em tempos, até tinha sido uma gaja boa, embora na altura não me apercebesse disso. Um clássico, tendemos a nunca estar satisfeitos com o que temos, só lhe dando valor quando o perdemos, vá-se lá saber porquê. No entanto, hoje em dia, estou perfeitamente contente com o meu corpo, com os seus refegos, rugas e flacidezes, consciente de que são absolutamente normais para a idade. Já dizia a Elle Macpherson, quando lhe perguntaram se não a incomodava estar a envelhecer; não, já pensou na alternativa?! Esta mulher madura (eu, não a Elle lol) não é, decididamente, uma pessoa atormentada nem amargurada. É, bem pelo contrário, bastante mais leve e descontraída do que a anterior, alguém que se sente bem consigo e com os outros. O caminho pode nem sempre ter sido fácil, mas fui apanhando todas as pedras para contruir um castelo. A serenidade e paz de espírito que transparecem desta última foto enchem-me de orgulho, não azedei, não quebrei, cresci e continuo a crescer, com prazer e alegria.

Venham mais trinta ;)

COM MÚSICA

terça-feira, 22 de agosto de 2017

FÉRIASSS!



   Como tem vindo a ser hábito, de há 13 anos para cá, fomos passar férias a Porto Covo. Este ano foi, no entanto, diferente
   Os amigos que tão simpática e generosamente nos costumam convidar, decidiram construir por lá e fomos para a casa deles em vez da que habitualmente arrendavam, o que acabou por se transformar numa verdadeira aventura.
   Começou por não sabermos, até à última hora, se seria possível ir para lá, dado que a casa estava ainda em construção. Durante meses fomos recebendo notícias do progresso da obra e alterando datas. Assim, fomos alternando entre não sabermos se a casa ia estar pronta a tempo e não sabermos se arranjávamos quem nos ficasse com a bicheza devido aos sucessivos adiamentos.
   Quanto a esta última questão, dado que acabámos por optar por uma solução em que uma família estrangeira se muda para nossa casa para o efeito, tendo, portanto, de reservar bilhetes de avião, alugar carro e tal e tal acabámos por ter de apostar, tipo poker, que a coisa fosse correr bem. Se não tivesse corrido estávamos já mentalmente preparados para ir acampar para o jardim de outro amigo, ele próprio com a casa já a abarrotar de gente, pois não nos seria possível ficar na nossa.
   A nossa única condição era termos uma retrete, tudo o resto dispensávamos, havíamos de nos arranjar. E foi o que fizemos. ;)
   As camas já tinham sido entregues pelo que também tínhamos isso, o que é um bocadinho mais confortável do que dormir em colchões insufláveis, mas chegámos a uma casa praticamente vazia, na qual, a funcionar, havia três retretes e dois duches.  O exterior, como alguém referiu, parecia Beirute.
   Na sala montou-se uma mesa de campismo e umas cadeiras dobráveis e fomos buscar umas pizzas. À noite lavámos os dentes no duche A partir daí foi só melhorar, todos os dias havia novidades. No dia seguinte montámos o frigorífico e passámos a poder ter comida em casa. Depois montámos o forno e o micro-ondas e pudémos cozinhar. Vieram de seguida montar dois dos três lavatórios e, para além dos dentes, passámos a também poder lavar uma loicita. Ás tantas improvisámos um balcão para a cozinha e foi uma festa, já tínhamos onde poisar coisas. Lá para o fim da estadia chegaram os sofás, que deixámos cobertos com o plástico de transporte, à chinesa, e a mesa da sala de jantar. Quando nos viemos embora já tinham colocado o lava loiças, uma das mais apreciadas melhorias.
   No exterior, ainda em terra, havia montes de pedras de calçada, gravilha, areia, tijolos e vento, o que quer dizer que tudo o que limpávamos no dia seguinte estava coberto de pó. Por muito que batêssemos os pés no capacho da entrada vinham sempre sujos. A mobília de jardim eram paletes, bidons, betoneiras e Bobcats. As decorações ferros soltos, baldes e bocados de plástico.



   A pedido do dono da casa, com uma embalagem de 150mts de rolo de plástico para charcutaria, improvisei cortinas, para que tivéssemos alguma privacidade à noite, candeeiros para quebrar a luz agressiva das lâmpadas penduradas no tecto, uma cortina de talho para uma porta que faltava, uma mesa de apoio, etc.


   De cada vez que tínhamos uma melhoria o que, como disse, acontecia diariamente, perguntávamo-nos como tínhamos conseguido viver sem ela anteriormente. A realidade é que estávamos todos tão mentalizados para acampar indoors que não nos incomodava realmente.
   Para alguns, talvez até mesmo para muitos, isto não são férias Pois fiquem sabendo que foram as melhores que tivemos nos últimos dezasseis anos! lol
   Foi tão giro ver uma casa a crescer aos poucos. Ir tendo todos os dias novas mordomias, coisas tão simples, que tomamos por certas em nossas casas. De manhã tratávamos de merdas e à tarde íamos para a praia, como de costume. Todas as noites jogámos, na nossa sala improvisada. Deu-me um gozo do caraças a improvisar coisas úteis com o rolo de plástico. Ainda arranjei tempo para ler e fazer dois chapéus em crochet. Ficámos doze dias, muito mais do que os habituais quatro ou cinco, enchemos a barriga de sol e praia e já estávamos com saudades da nossa casinha e das nossas meninas e voltei com um bronze fantástico, como já não tinha há muitos anos.
   Durante a estadia ia vendo, num grupo de WhatsApp para o qual tive a honra de ser convidada ;), fotos das férias paradisíacas deles, em paragens longínquas e hotéis fantásticos e senti zero inveja. Não quer dizer que não goste também de sair de cá, de arejar a cabeça, de me dépayser, como dizem os franceses, termo cuja equivalência não me ocorre agora em português. É aliás a única coisa que realmente me faz falta, nesta porcaria desta condição financeira em que nos encontramos; viajar.  Mas, para mim, não há nada que chegue aos calcanhares de umas boas férias passadas entre amigos.


   Mais uma vez, muito obrigada Sofia e Carlos, por estes dias maravilhosos que nos proporcionaram, bem hajam.


COM MÚSICA