domingo, 11 de outubro de 2009

Emoção e razão

COM MÚSICA

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É inegável a monumental evolução sofrida pela humanidade ao longo dos tempos. O homem conseguiu feitos prodigiosos e sem qualquer dúvida mudou o mundo. Pergunto-me no entanto se haverá um paralelo a nível individual… se o homem do século XXI será assim tão diferente do da idade média… Auto-denominamo-nos “animais racionais”, mas julgo que a maior parte das pessoas use muito pouco essa racionalidade no seu dia a dia. Parece existir a convicção de que certas coisas, por partirem do nosso lado emocional, simplesmente não são controláveis. Permitam-me discordar… Li algures que a diferença entre nós e os animais ditos irracionais é a consciência teórica, a capacidade de imaginar o futuro e muda-lo com atitudes no presente. Todos estamos conscientes da acção/reacção, atitude/consequência, causa/efeito… mas poucos se dão conta de que isto é válido para todos os nossos actos, todas a nossas atitudes perante a vida. A racionalidade não é geralmente muito bem encarada. É frequentemente associada a frieza, calculismo, oportunismo, parece que o homem, de certa forma, se envergonha da sua capacidade de “somar dois e dois” e a renega como se isso o desumanizasse o que, convenhamos, é um bocado contraditório.
A realidade é que há emoções, sentimentos, que são invariavelmente danosos, de uma forma ou de outra e que, se fossem controlados por cada um de nós gerariam uma humanidade sem dúvida muito mais harmoniosa. Notem que não estou de todo, mas de forma alguma, a rejeitar as emoções em geral. Antes pelo contrário, acho que devemos, no que é benéfico, deixar fluir os sentimentos, partilha-los, abraça-los. Na minha opinião “sentir” é bom, muito bom, não acho que devamos fechar-nos numa carapaça de insensibilidade para com o mundo. No entanto, como referi, certos sentimentos levam ás vezes a atitudes irracionais, irreflectidas, que acabam no fundo por só prejudicar, a nós e/ou aos outros. Se nos permitirmos analisa-los, estuda-los de cabeça fria, chegaremos muitas vezes à conclusão que manter certas emoções à rédea curta só nos irá trazer benefícios. A maior parte de nós cresceu num mundo com uma visão romântica da vida. Só para dar alguns exemplos, sentimentos como a honra, o orgulho, o ciúme, a paixão cega são, não só aceites, como muitas vezes exaltados. Há não tanto tempo como isso, faziam-se duelos em defesa da honra, quantos homens não perderam a vida para não perder a face socialmente… Ouve-se frequentemente a afirmação de que alguém não aceita ajuda por ter o seu orgulho, preferindo penar a aceitar uma mão amiga… Os crimes passionais são geralmente encarados com uma certa indulgência, embora penalmente não seja atenuante, sê-lo-á possivelmente na cabeça de muita gente… Há quem viva infeliz toda uma vida em nome de uma paixão, quem desista de tudo e de todos por causa e um amor que na pratica, no dia a dia, não lhe trás qualquer satisfação… Alguma destas coisas vos parece fazer sentido? Claro que fui buscar exemplos caricaturais, extremos, mas só para tentar explicar o meu ponto de vista. Usando um mais concreto, em conversa privada, relativamente ao meu último post , um amigo afirmou que para ele, a questão de como lidar com uma atracção por outra pessoa, nem sequer se punha. O simples sentimento seria considerado como traição e ditaria o fim da relação existente. Ou seja, sem margem para dúvidas, sem espaço de manobra… vendo-se na situação descrita a coisa a fazer seria mandar tudo às urtigas e dizer adeus. Na minha opinião, as coisas boas que temos na vida são para se agarrar com unhas e dentes, para se defender com todas as armas ao nosso dispor, e o nosso cérebro é sem dúvida alguma uma delas. Como seres humanos que somos, sentimos… e ás vezes sentimos o que não devíamos, mas não estamos por isso condenados, não temos de baixar os braços e desistir, considerar-nos vencidos, podemos lutar contra sentimentos indesejados. Talvez não possamos cala-los, talvez não possamos ignora-los, mas podemos racionaliza-los e agir de forma a que causem o menor dano possível. E isto é válido para qualquer sentimento que nos consuma sem trazer nada de bom, para o ciúme, para a raiva, para a inveja, para a vingança... Talvez não possamos impedir que apareçam, mas podemos certamente controla-los. Podemos estimular em nós os sentimentos positivos, aqueles que trazem harmonia à nossa vida e à dos que nos rodeiam e manter à rédea curta os que não servem senão para trazer problemas. O nosso cérebro permite-nos fazer isso, basta acreditar que seja possível. Claro que não é fácil, os nossos instintos são muito fortes. Requer treino, implica tentar e falhar e voltar a tentar. Mas se partirmos do principio de que não é possível, não iremos com certeza chegar a lado nenhum. Errar é humano, não há formulas mágicas, não há milagres, não há certezas nem verdades absolutas… iremos certamente meter o pé na argola, a pata na poça, muitas vezes ao longo do caminho. Mas se tivermos em vista a tal “capacidade de imaginar o futuro e muda-lo com atitudes no presente” iremos cada vez mais ter atitudes sensatas, que nos levem a bom porto. Fazendo um paralelo, ao trazermos um cão para casa, sabemos que teremos de treina-lo. Se não o fizermos irá naturalmente fazer as suas necessidades por todo o lado, roer os móveis, etc… tornando o convívio insuportável. Não o privando da sua essência iremos então tentar que se adapte de forma agradável à nossa vivência. Porque não fazê-lo também relativamente a nós próprios perante a vida?
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6 comentários:

  1. Um dia destes empresto-te um certo livro que tenho para lá sobre o título do teu post, entretanto vai lendo este artigo amador sobre o assunto.

    ;-)

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  2. Qual, a "Inteligência Emocional" do Daniel Goleman? Se for esse já tenho, ofereceu-me um admirador secreto... mas ainda não tive tempo de ler. ;)

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  3. “Só para dar alguns exemplos, sentimentos como a honra, o orgulho, o ciúme, a paixão cega são, não só aceites, como muitas vezes exaltados.”

    Para variar, não podia deixar de concordar com tudo quanto dizes neste post e porque o tema me é familiar. Já fui muitas vezes apelidada de fria, antipática, racional e já chega de epítetos, certinho? Porque tento, umas vezes com sucesso, outras não, nunca agir no calor das emoções, porque sempre que o fiz, não gostei.

    Se atingi alguma racionalidade, umas vezes mais, outras menos, foi através de exercícios, a que me imponho, mas não o sou naturalmente. Por isso estabeleci o meu perímetro de conforto, porque prefiro estar de pé atrás, aliás com os dois pés atrás, mas com a esperança toda lá à frente e tenho-me dado muito bem.

    É tudo uma questão de exercício ou ginástica mental, cálculos e lei do menor esforço. Para quê complicar o simples?

    É que, ao agirmos a quente, ou deixando que os ciúmes – que não sinto, lamento – a raiva, a fúria ou a paixão, nos conduzam, quantas vezes no após, não pensamos que não devíamos ter dito isto ou aquilo, não seria assim que faríamos as coisas, etc. Nem que seja por uma questão de preguiça em lidar com arrependimentos, pedidos de desculpa e que mais, é sempre melhor reflectir.

    Porque já temos a nossa quota de insucessos históricos, levados a cabo por gente irreflectida. Porque, alguns de nós, já temos a nossa quota de insucessos pessoais. Porque não se pode decidir sob o efeito de paixões.

    Inspirar – apneia longa – expirar e depois agir.

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  4. Nope.
    Não é esse.
    Referia-me mesmo a "O Erro de Descartes - Emoção, Razão e Cérebro Humano" de António Damásio.

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  5. Ah, ok. Também gostava de ler esse, sim. Mas primeiro quero ler o outro. Tks! ;)

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  6. Bem interessante a tua conclusão, especialmente o exemplo do cão. ( no entanto não sei se se aplicaria a um gato… ) É um bom caminho que dá para pensar…

    Em todo o caso, e não obstante não ser “fair” fazer aqui um comentário a um blog alheio, o “sinto logo existo” é também bem interessante.

    Baralha-nos !

    Onde ficamos então ?

    Eu diria que os dois estão bem ! É ! Apesar de opostos estão ambos bem ! Depende é de quem os lê !

    E ai tenho de concordar com a visão “romântica” da vida que nos é incutida pela sociedade desde pequenos, basta ver os desenhos animados, as letras das musicas, os filmes ( que não os de Ingrid Bergman ) para perceber que é neste contexto que muitos de nós , a maioria, fomos educados. … and they live happy for ever …

    Depois, vem a realidade. Com os anos e experiências vamos percebendo que as coisas não são exactamente assim. Os mais “fortes” , mais racionais, que melhor controlam a emoção com a sua razão, vão-se adaptando às mudanças, não sem que criem dentro de sí “stress”. Outros, mais “fracos” , mais emocionais, perante uma situação de conflito preferem “partir a loiça” e procurar outro caminho… muitas vezes desconhecido…sem certezas de ser melhor ou pior…

    Penso que o que distingue uns e outros são as experiências adquiridas e a vontade de pensar sobre elas.

    Ah, fazer apneia, por vezes é uma muito boa solução desde que não excessivamente longa, pois pode-nos faltar o ar…

    Como era bom não termos de pensar sobre as más experiências por não as termos… (Secanevassefaziasecaski)

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