terça-feira, 15 de março de 2011

Advogando pelo Diabo

COM MÚSICA



Quando gostamos de uma pessoa e a sabemos em baixo é natural que tenhamos vontade de ajudar…
Frequentemente, quem não está bem, tende a perder a objectividade, a noção de perspectiva, a capacidade de análise. A dor e/ou a aflição tipicamente embargam a clareza de espírito.
Alguém que não esteja emocionalmente envolvido, poderá nesses casos trazer uma nova luz ás questões, no sentido de tentar desembrulhar ideias e/ou arranjar soluções.

Para tal, é no entanto ás vezes necessário fazer o papel de “advogado do diabo”.
Relembrar que uma questão tem sempre vários lados, apresentar visões alternativas sobre o tema, apontar eventuais pontos fracos no raciocínio que estava a ser seguido, sugerir ideias que não serão obrigatoriamente muito bem aceites à partida.

Há, no entanto, um factor extremamente importante a ter em conta, que é a fragilidade de quem está do outro lado. Normalmente, nestas situações, as pessoas ficam sensíveis, susceptíveis, pouco flexíveis.
Logo, a diplomacia, a forma como apresentamos as nossas ideias, as palavras que utilizamos, o tom de voz, tornam-se extremamente importantes.
Um passo em falso e pode ser pior a emenda do que o soneto. A melhor das boas intenções, sem os devidos cuidados, pode facilmente deixar a pessoa em pior estado do que já estava. 

Por exemplo, o método agressivo, o clássico abanão destinado a fazer o outro reagir, não será possivelmente, na maioria dos casos, o melhor caminho para se obter resultados em alturas de crise.
Se a estrutura emocional já está  rachada, isto pode fazer com que parta. Nos momentos difíceis, as pessoas não têm normalmente capacidade de reacção a tratamentos de choque, encarando-os como uma agressão. Atitudes que surtiriam eventualmente efeito, se estivessem no seu “estado normal”, podem nestes casos obter o efeito diametralmente oposto. Podem inclusivamente colocar-nos na posição de “inimigo”, do qual é necessário proteger-se e com quem não irão certamente colaborar.

E no que diz respeito à colaboração, esta é extremamente importante, pois ninguém consegue ajudar quem não quiser ser ajudado.
Como tal, desprezar as suas ideias e sentimentos relativamente ao assunto e tentar impor a nossa própria visão, não será provavelmente a coisa mais inteligente a fazer. Mesmo que seja claro para nós que o seu raciocínio e sensibilidade possam estar alterados, menospreza-los não será propriamente um acto que inspire grande confiança. Adoptar uma atitude do género “eu estou certo e tu estás errado” é meio caminho andado para que fechem a porta á nossa tentativa de ajuda.

Na mesma óptica, raciocínios lógicos e óbvios para nós, podem não o ser para quem está dentro da situação. É preciso não esquecer o lado emocional envolvido. Apresentar soluções radicais a quem não esteja disposto a ouvi-las, acaba por ser contraproducente e por vezes até tomado como insultuoso.  Mais uma vez podemos assim ser facilmente encarados como agressores quando tudo o que queríamos era contribuir para a solução dos problemas.

Fornecer o “pior cenário” numa bandeja, na expectativa de preparar para o que der e vier, também não me parece propriamente produtivo. A ideia é aligeirar a situação e não enegrecê-la. Por muito que estejamos a ver que as coisas possam ainda piorar, a não ser que seja algo de iminente, não consigo ver qualquer vantagem em assustar o outro com um rol de possíveis desfechos desfavoráveis, o próprio já terá certamente pensado numa série deles.
Lidar com a realidade e o que está efectivamente em jogo no momento, sem divagar sobre outras possibilidades, parece-me bem mais positivo.

Quando as situações envolvem terceiros, é importante ter em conta o seu lado da questão. Geralmente, na vida real, não há bons nem maus da fita.
No entanto, se o quisermos fazer ver à pessoa que estamos a tentar ajudar, é bom que o façamos com pezinhos de lã. Se houver desentendimento, contenda, amargura, puxar ostensivamente a brasa à sardinha do outro, não é nitidamente o melhor caminho. Irá, pelo contrário, aumentar o ressentimento e gerar uma sensação de falta de apoio.

Finalmente, os timings são importantes.
Há quem tenha tendência, quando alguém cai à sua frente, a tentar logo levanta-lo. No entanto, sobretudo se se magoaram na queda, as pessoas precisam de um tempinho antes de se voltarem a pôr em pé.
Facultar-lhes esse tempo é de uma importância extrema. Puxa-los por um braço e tentar arranca-los do chão, só irá provocar mais dor e desconforto. Embora não seja fácil acompanhar de braços cruzados, é importante ter a sensibilidade de perceber quando estão prontos a reagir.

1 comentário:

  1. Cristina,

    No divã poderíamos dizer que isso seria uma intervenção selvagem. Tudo tem a sua hora e forma... pena que mesmo nos amando algumas pessoas não conseguem dar conta de lidar com a dor.

    Abraços,

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