COM MÚSICA
Ao longo dos tempos os hábitos, a vida prática, as atitudes, as regras de convivência em sociedade, vão mudando. O homem vai-se moldando a novas realidades, vai-se, mal ou bem, adaptando ao mundo em que vive.
Para alguns estas mudanças são mais difíceis de encarar do que para outros. Algumas pessoas tendem a agarrar-se com unhas e dentes ás suas “tradições”, à forma como as coisas funcionavam nas gerações anteriores, que lhes foram transmitidas pela vivência, pela educação.
Lembro-me, aquando da morte do meu pai, de uma pessoa da minha família se ter sentido indignada por eu me recusar a enviar (pelo correio) as antigamente habituais cartas de agradecimento, pelas condolências que me tinham sido dirigidas.
Não fazia no entanto para mim qualquer sentido. A todos agradeci, no momento, do fundo do coração.
A ideia de passar umas horas a escrevinhar à mão palavras em série, pareceu-me uma verdadeira perca de tempo. Tentar imaginar a reacção dos potenciais visados, ao abrirem a caixa do correio e darem de caras com um envelopezinho de borda preta, ainda me valeu uma que outra gargalhada interior.
A realidade é que algumas coisas, por razões várias, pura e simplesmente deixam de fazer sentido.
Quem é que, hoje em dia, tem tempo para passar a ferro toalhas ou lençóis de linho bordado, arear pratas, ou lavar fraldas?! Neste último caso está inclusivamente provado que, as modernas fraldas descartáveis, apesar de menos ecológicas, são muito melhores para os bebés, que têm agora os rabinhos sempre secos.
Quem é que tem casa para aqueles roupeiros fantásticos, em madeira maciça, com dois metros e meio de altura, para mesas de sala de jantar para dezoito pessoas, para lustres gigantescos?
Parece-me perfeitamente lógico que a tendência seja deixarmos cada vez mais de ter objectos físicos, a vida tende a tornar-se mais “digital”... Podemos ter toda a nossa música dentro de um iPod e os filmes num disco rígido. As coisas já não precisam de ocupar o nosso tão precioso espaço. Podem ser substituídas por formas de organização mais lógicas, mais fáceis de consultar, mais diminutas.
Por muito que pense, não consigo encontrar uma única vantagem em ter uma discoteca sob a forma de CDs, já para não falar dos vinis. Não são propriamente bonitos, ocupam espaço, têm caixas de plástico, uma pessoa vê-se grega para encontrar a musica que quer.
No que respeita aos livros, já o caso é muito diferente... São, pelo menos alguns, objectos lindíssimos, decorativos, têm um cheiro insubstituível, um manuseamento agradável, têm alma.
Há portanto que ter cuidado para não cair em extremos e não começar a descartar em excesso.
Da mesma forma, há comportamentos que também têm real valor, de que seria uma pena abrirmos mão. E no entanto, parece ser o que está a acontecer...
Tenho vindo a sentir-me cada vez mais “demodée”, para não utilizar a expressão “velha” que o meu filho não deixa, relativamente aos comportamentos humanos. Não consigo simplesmente compreende-los e, pior ainda, acho que são extremamente nocivos para a sociedade.
Não acho normal chegar-se com uma hora, hora e meia, de atraso a qualquer lado, na maior das descontrações. Não acho normal só se responder a convites se se estiver potencialmente interessado nos mesmos. Não acho normal aceita-los e baldarmo-nos á última da hora, porque afinal não nos apeteceu ir, ou porque surgiu entretanto um programa mais interessante. Não acho normal não se responder alguém que nos contacte, só porque ainda não temos uma resposta concreta a dar.
Na minha opinião, qualquer uma destas atitudes, ou outra do mesmo género, denota de uma incrível falta de consideração e respeito pelo próximo. Infelizmente, hoje em dia, parecem ser comummente aceites, como se não tivessem qualquer importância.
Quem as pratica aceita-as com a mesma ligeireza, quem contra elas se insurge fica rotulada de “careta”.
Acontece que não consigo acreditar que esta postura possa contribuir para o bem estar geral.
Qualquer uma das situações que descrevi acima, implica que alguém saia eventualmente lesado com a história... os jantares arrefecem, as pessoas não conseguem fazer planos por falta de informação, deixam-nos na dúvida sobre a recepção do “recado”, custam dinheiro umas vezes, outras simplesmente esforço.
Este esbanjamento, ou desperdiçar se preferirem, de energia, o não considerar minimamente o outro lado, não sentir empatia pelo próximo... arrefecem terrivelmente as relações humanas. Assume-se o “estou-me nas tintas para o próximo e aceito na boa que ele se esteja nas tintas para mim”. É triste, é muito triste.
Alguns dirão, ah, que não é bem assim e tal e coiso, e que se as pessoas não se chateiam porque que não se há de fazer, e que os dias de hoje são muito preenchidos e stressantes, que não temos tempo nem para respirar, quanto mais para dar atenção a terceiros...
Pois, meus amigos, acreditem que, um dia, esta vos irá fazer falta!
Conforme me fui dando conta de que me estava a tornar um animal em vias de extinção, fui gesticulando menos, reclamando menos, com menos ímpeto.
Não posso impôr a ninguém a minha visão sobre a questão, por muito que a considere “a certa”.
Posso no entanto lutar por ela e, do alto da minha presunção, tentar “fazer ver a luz”.
As reacções são das mais variadas... desde aqueles que reconhecem uma atitude pouco simpática e se mostram genuinamente incomodados com a sua “falha”, àqueles que não conseguem sequer compreender a importância da coisa, passando pelos que dizem que sim mas que também, arranjam mil e duas justificações validíssimas, para a sua conduta e amanhã se for preciso voltam a fazer o mesmo.
Mas sabem que mais?!... Fiquem atentos e observem que, os primeiros, são aqueles com quem desenvolvemos verdadeiras relações de amizade!
E esta, hein?! ;)
Estamos em sintonia Cristina com a possível excepção da desmaterialização da música ... No que diz respeito à forma como as pessoas tendem a comportar-se relativamente aos compromissos que assumem deixa-me triste. Mas sabes que é o reflexo de uma inversão completa dos valores, os resultados é que contam e tudo absolutamente tudo vale para os obter. Não para mim. A isso recuso de me adaptar e continuarei a dizer que é um erro.
ResponderEliminarOk, consigo conceber que por enquanto, para quem tenha um ouvido "gourmet"(o que não é o meu caso, a música em digital não soe ao mesmo... lol
ResponderEliminarQuanto ás pessoas, na minha opinião é muito mais grave do que se se tratassem de meios para obter fins... acho é que se está mesmo tudo a cagar (pardon my french). É triste, sim.