sexta-feira, 4 de maio de 2007

Terapia da fala

A minha mãe ultimamente gosta muito de dizer que chegou à conclusão de que "a falar é que a gente não se entende" o que, devo confessar, muito me irrita...
Repete-o tanto que me pôs a pensar.
Será que ela tem razão?

Quanto mais penso sobre o assunto menos de acordo estou com ela.
Sempre resolvi os assuntos na minha vida conversando.
E quando não conversei, não os resolvi.

"Falar" por escrito é um pau de dois bicos.
Tem a vantagem de não se ser interrompido, de se poder expor o nosso ponto de vista do princípio ao fim sem que haja divagações pelo meio, é mais fácil seguir um raciocínio.
O facto de não se estar cara a cara também pode eventualmente ajudar a deixar sair assuntos mais "delicados".
Tem também a seu favor o facto de se poder dizer coisas que eventualmente irão despoletar emoções sem que a outra pessoa esteja presente, dando-lhe assim o tempo de reagir perante essas emoções em privado e de pensar nelas antes de responder, se for caso disso.
É no entanto perigoso porque se corre o risco de ser mal interpretado.
Nem sempre conseguimos ser claros nas nossas exposições.
Se a outra pessoa estiver à nossa frente reage ao que dizemos e mais facilmente podemos perceber se estamos a conseguir transmitir realmente o que queríamos.
Quando não é o caso podemos estar a seguir uma linha de pensamento que está a ser levada para "sítios" que nem imaginamos.
Por outro lado, havendo reacção, ás vezes podíamos poupar muito tempo em exposições/explicações ás vezes inúteis. Podemos por exemplo estar nós próprios a reagir a uma coisa que na realidade não aconteceu (um acontecimento, um pensamento/reacção da parte do outro ou mesmo um mal entendido inicial...) se fossemos informados desse facto no início poderíamos poupar o nosso latim...
Para além de tudo isto corre-se o risco da nossa "conversa" ser "apanhada" por alguém a quem não era dirigida o que pode gerar ainda mais confusão.

Mas enfim, isto era só uma divagação sobre a conversa escrita, o assunto era mesmo a conversa em geral...
Perguntei-me porque seria que a minha mãe teria esta ideia, quanto a mim absurda...
Cheguei à conclusão de que se calhar não é tão absurda assim... há talvez algumas pessoas (ás vezes circunstancias) com quem não vale a pena falar. Agora isto não quer dizer que "a gente" se entenda não falando. O que provavelmente quer dizer é que, com essas pessoas (ou nessas circunstancias) não há de facto qualquer entendimento possível.
São uma espécie de papagaios das relações humanas.
Dizemos-lhe "bom dia".
Respondem "bom dia".
Continuamos "estás bom?"
Respondem "bom dia"
Tentamos "como é que te chamas?"
Respondem "bom dia, cruáááá"
Estou na brincadeira mas é de facto como me sinto ás vezes...

Há gente que simplesmente não reage à nossa conversa.
Acho que na realidade não a ouve... vai repetindo as mesmas coisas over and over again sem nunca ouvir o que temos para dizer, sem nunca pensar nisso.
Tive um bocadinho essa sensação em algumas das minhas separações (neste caso é circunstancial, não tem a ver com as pessoas em questão) tentei falar, dialogar, explicar e dei de caras com paredes. Acho que simplesmente nunca ouviram o que eu estava a dizer... A prova é que, depois de dezenas de horas de explicações, continuavam a perguntar "porquê?".
Mas ás vezes é mais grave, há pessoas que são mesmo assim.
Tenho neste momento um assunto de trabalho "pendente" porque o interlocutor é "desses". Tem sempre razão e raramente se engana, é das pessoas mais prepotentes que alguma vez conheci e pura e simplesmente não ouve...
De facto, nestes casos, "a gente a falar é que não se entende", quanto muito desentende-se ainda mais... o que não quer dizer que se entenda se não falar.
O melhor mesmo é desistir, proteger-se e "seja o que Deus quiser"...

Agora que não haja dúvidas de que não falar pode ter consequências sérias...
Muitas pessoas se acham grandes juízes do que se passa na cabeça alheia.
Isto pode dar tanto azo a mal entendidos como a tal "conversa escrita".
Por muita intuição que se tenha esta nunca é infalível e se não se puserem as coisas em pratos limpos vai-se andando, mas anda-se muitas vezes coxo.
Eu acredito no falar para resolver situações.
Sempre que não falei saiu-me o tiro pela culatra.
Ainda tenho cicatrizes de situações provocadas por coisas que "não disse", pelo menos na altura em que devia ter dito e que mais tarde são irrecuperáveis.

É desgastante ás vezes falar, esclarecer as coisas...
Confrontamos situações em que era mais fácil ás vezes "esconder o sol com a peneira", fazer de conta que não existem.
Ou achamos que vamos estragar "a magia" de alguma coisa.
Ou então que podemos "estragar tudo" levantando certas questões.
Ás vezes ouvimos coisas de que não gostamos... mas quem sabe se não era necessário ouvi-las?
Obriga a por em questão as nossas ideias, os nossos sentimentos...
Nem sempre é fácil falar, ás vezes temos a sensação de estar a falar com a(s) outra(s) pessoa(s) numa língua diferente...
Ou há agressividade, ressentimento, dor, insegurança à mistura o que não é fácil de enfrentar.
Mas se se conseguir falar, sobretudo se se conseguir escolher o momento mais certo (ou ás vezes "menos errado") para o fazer, resolve-se de facto a maior parte das questões.
Evita-nos ás vezes de desistir de coisas que são importantes para nós ou pelo contrário de insistir em coisas de que na realidade deveríamos desistir.
Ajuda-nos a ganhar "SABEDORIA PARA PERCEBER A DIFERENÇA"...
Eu continuo a acreditar que, sendo possível, é bom falar de tudo e mais alguma coisa...


4 comentários:

  1. Talvez por não saber falar de cor, imaginei.... Se por falar, falei, pensei que se falasse era mais fácil de entender... nem sempre...

    Falar ou não falar? - that's the question!

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  2. Devia ser como no cinema,
    A língua inglesa fica sempre bem
    E nunca atraiçoa ninguém.


    O problema com o falar é mesmo que anda tanta gente por aí com problemas de expressão...

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  3. Dizia um amigo nosso dos tempos da Avenida de Roma, que "o falar é muito importante". Ele lá sabia do que falava! Agora falando sério, concordo contigo: nada como uma boa conversa, cara a cara. O meu lema no emprego é, aliás, não telefone, vá! Percorro quilómetros naquele edifício para evitar o telefone, o telemóvel e o mail.

    BZ

    CM

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